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"Crenças e Desavenças" - Editora Baraúna
"Qual será o Sabor da crônica?" - Editora Baraúna
Cada título contém 40 crônicas e pequenos contos de pura alegria com o mesmo número de receitas "que dão certo". Pedidos através:
www.editorabarauna.com.br - www.livrariacultura.com.br - jbgregor@uol.com.br

terça-feira, 23 de novembro de 2010

O VALDIR

  Nos Estados Unidos pela segunda vez, tive o privilégio de viajar , com o Valdir e seu irmão em um caminhão-carreta, percorrendo toda a costa leste daquele País, de Boston à Miami. 
Parávamos em todas as grandes cidades para a troca de carga, descanso ou apenas para um pequeno turismo.

Dois irmãos, amigos de minha filha que por lá moram há muitos anos, tinham uma pequena frota de caminhões e faziam fretes dos mais variados por todo o continente. Saímos de Boston sob intensa nevasca e chegamos à Flórida com um sol escaldante. A carreta é como um mini apt°, contendo fogão, frigobar, beliche, TV, computador e tudo o mais... menos banheiro. 


Para se fazer "xixí" era necessário um pequeno malabarismo, num saquinho plástico tipo "zip lock" (com a medida draconiana de 300 ml), em pé e com o veículo em movimento. 
 O saquinho, hermeticamente fechado, era atirado pela janela e antes mesmo de cair na neve, o líquido já congelava, tal era o rigor do frio.


Contou-me o Valdir que, certa vez, ao jogar o conteúdo pela janela, não percebeu que o vidro estava fechado. Resultado:  o saquinho estourou, esparramando-se o conteúdo por toda a sua roupa. Como estava sozinho ao volante tentou, com muito custo, trocar a roupa molhada e quando estava somente de ceroulas (americanos só usam "samba canção"), um guarda rodoviário parou o caminhão.


Foi constrangedor explicar para o policial o porquê da situação, ainda mais que os desenhos-tema de sua cueca eram variações sobre o coelho Pernalonga.


Durante todo o percurso (que durou 15 dias) comemos a mesma coisa: chickens (carne de frango) sob as mais variadas formas. A única refeição decente que tivemos foi numa reserva dos índios seminoles, na Flórida, à base de Aligator (crocodilo) e camarões. Do jacaré não trago lembranças mas dos camarões!!!! Portanto, anotem aí uma receita parecida que aprendi por aquí que me faz lembrar da de lá, a qual batizei de:
CAMARÕES SEMINOLES
 Duas dúzias de camarões grandes (VG) com casca; 4 colheres (sopa) de azeite de oliva; 4 colheres (sopa) de manteiga; 10 dentes de alho cortados em pedaços; 1 colher (sopa) de caldo limão; 10 gramas de ervas (sálvia, tomilho, manjericão. etc); 1 colher (sopa) rasa de páprica picante; 1 colher (chá) de gengibre ralada; 1 colher (chá) de ajinomoto e sal a gosto.
Modo de Fazer: Abra os camarões, fazendo um corte ao longo do dorso (se camarão tiver costas, dorso é costas), deixando-os com a casca. Pressione a parte chata para expor um pouco a carne dos camarões Tempere-os com a páprica, ajinomoto, sal, limão, ervas e gengibre.  
Numa grelha pré-aquecida, grelhe os camarões com a casca para cima por mais ou menos 5 minutos. Em uma frigideira pequena prepare o molho derretendo a manteiga com o azeite, em fogo baixo. Junte o alho, um pouco de sal e deixe cozinhar por uns 5 a 7 minutos ou até que o alho fique dourado. Despeje esse molho bem quente sobre os camarões e sirva acompanhado de arroz com Castanhas ( Colocar o arroz numa forma de buraco no meio, desenformar e arrumar no centro do prato, guarnecido com os camarões em volta.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A DAIDE

  ''Vamos Falar de saudade, que eu hoje estou prá chorar...” 
Assim cantava Nora Ney, grande sucesso do final dos anos 50 e inicio dos 60.

E é dessa época que me veem as melhores lembranças de minha querida irmã,  Maria Adelaide, cuja vida, há exatamente, dois anos, foi tragicamente ceifada sob as rodas de um veículo qualquer.

Lembro-me dela cuidando de nós, seus irmãozinhos mais novos, de uma forma extremamente carinhosa e alegre. Sempre cantando e sorrindo, dando-nos o banho diário, penteando nossos cabelos, vestindo-nos e levando-nos à Igreja ou para passeios.

Recordo, nitidamente, o dia em que me levou ao “Foto 5 minutos” para “tirarmos” o retrato que ilustra esta crônica. Para frustrar sua intenção, eu peguei uma tesoura e cortei um pedaço de minha franja (reparem o detalhe na foto), mas não houve desculpas e fui contrariado. Saí de cara feia, ainda mais por que ela não quis comprar-me um sorvete, alegando que  poderia sujar a camisa nova: _Só depois da foto!

Lá em casa, era chamada de “Maria Força e Luz” e ganhou esse apelido após ter subido em um banquinho para tentar consertar uma luminária da cozinha. Levou o maior choque, estatelando-se no chão, sob a vaia de todos os irmãos.

Após a adolescência, seus problemas começaram: Acometida de uma enfermidade auditiva, sofreu muito com as dores e seqüelas das cirurgias pelas quais passou. Casou-se com o único namorado que teve, separou-se ainda nova e voltou para casa com os três filhos pequenos, já com os transtornos que a atormentaram por muitos anos e que tanto fizeram sofrer, também a nós, que a amávamos tanto.

Não obstante seus males, os quais, muitas vezes, deixavam-na alienada da própria existência, era um ser humano maravilhoso e bondoso a ponto de doar tudo o que tinha para os mais necessitados. Fazia visitas diárias aos asilos, velórios, enfermos e  amigos. Pela cidade toda, levava a alegria de seu grande coração.

Sua religiosidade não tinha nada das convenções impostas e professava a espiritualidade de uma maneira própria e eclética, freqüentando, com a mesma fé, tanto as igrejas católicas como as evangélicas ou espiritualistas. Onde tinha hinos e orações, a Daide estava presente!

Foi, nesta vida, uma presença marcante para nós e para seus amigos, e creio que sua missão maior foi cumprida: três filhos e netos, exemplares e honrados, que nos deixou para engrandecer ainda mais seu nome e suas lembranças.
Em fim; ela não nos abandonou...apenas foi na frente!
 
Perdoem-me os leitores mas, pelo menos desta vez, não tenho crônicas divertidas para publicar pois só me ocorrem os versos que a Nora Ney cantava...

terça-feira, 9 de novembro de 2010

A BASSAM

  Certo dia cheguei na casa de minha sogra, em Paracatu e a encontrei atendendo um consulente. Era um japonês miudinho, muito cortês e sorridente, chamado Mario Okamura.
Enquanto ela traduzia os sortilégios e premonições das cartas, ele gravava tudo num pequeno aparelho portátil. 
O japonês, ou nissei, dizia ter uma fazenda no município e estava pensando em trazer seus pais e irmãos, que moravam em uma chácara em Jaboticabal/SP. Enquanto ele falava, não tirava os olhos da Carla, filha mais nova de minha sogra e solteira ainda. 
O baralho foi cortado, por três vezes até que  as cartas começaram a falar:“Você deve trazer apenas teus pais; se os irmãos vierem também, vão trazer-lhe infelicidades!”

 Enquanto a Carla servia um cafezinho, o japonês perguntou, ruborizado: “A Bassam quer trazer uma moça que gosta de mim, pra casar, será que vai dar certo?. 
Cibelle, percebendo a paquera cerrada entre a filha e o rapaz, perguntou quem era a Bassam.
“É minha mãe, ela acha que já passei do tempo de arranjar uma esposa e quer trazer a Mieko pra cá...” 

Mais  uma vez as cartas foram embaralhadas e abertas sobre a mesa: “Diga à dona Bassam que teu casamento está próximo e não será com japonesa e nem descendente. Vai ser com moça daqui mesmo.”

Quando o japonês foi-se embora eu ainda disse, intrigado: “Mas Cibelle, dessa vez você exagerou...Olha que o rapaz gravou tudo!” Minha sogra fez um muxoxo e afirmou: “Fica tranquilo que eu sei o que estou fazendo.”

 Daí a alguns dias, o Mario voltou meio preocupado dizendo que os bezerros da fazenda estavam doentes, com umbigos inflamados e diarréia e queria que ela fosse até a propriedade para benzer os animais. 
No dia seguinte lá foi ela mais a Carla na boléia da caminhonete do japonês, levando consigo seus unguentos milagrosos . 
Enquanto ela fazia as rezas secretas, o retireiro esfregava a solução de ervas nos animais. Carla e Mario saíram para conhecer a propriedade e quando voltaram já estavam de mão dadas e sorridentes.Mais uns dias de visitas e o namoro estava consolidado, com o maior apoio de minha sogra.

Quando Mario resolveu-se a buscar seus pais, minha cunhada foi junto, voltando de ônibus-leito, em companhia da futura sogra, a tal da Dona Bassam.
 Lá para o meio da noite, a senhora sentiu vontade de fazer xixi mas, quando, com muito custo, abriu a porta do minúsculo banheiro, deu um gritinho envergonhado e voltou, apressada, para a poltrona:
 “Tem outra japonesa lá dentro, né! E eu não aguento segurar, né!” 
 Percebendo o desassossego da mulher, minha cunhada acompanhou-a de volta ao WC. A porta estava apenas encostada e lá dentro não tinha ninguém; apenas um grande espelho que ia do teto ao chão. 
Mirando as duas imagens refletidas, Carla perguntou: ‘É aquela a japonesa que a senhora viu?”
Meio abobada a senhora balbuciou: “Nossa, eu confundi eu com eu mesma, né?!”

Aquilo serviu de piada por muitos anos e pouco tempo antes de se casar, minha cunhada descobriu que o Mario era apenas o administrador da fazenda de outros japoneses ricos. Mesmo assim o casamento se consumou e eles tiveram duas filhas lindas, mistura de sangue japonês com espanhol e italiano. 

Em fim: O japonês mentiu mas “as cartas não mentem jamais...”

Cibelle ensinou-me a fazer pão aromático de batatas muito saboroso.Vale a pena conferir.

 PÃES DE BATATAS E MANJERICÃO:  1 ½ kg de farinha de trigo; 50 gramas de fermento; 4 colheres de manteiga derretida; 1 colher (sopa) rasa de sal; 2 colheres (sopa) cheias de açúcar; 3 ovos inteiros; 1 kg de batatas (ou mandiocas), cozidas e amassadas ou espremidas; 2 colheres (sopa) de manjericão fresco, picado e leite morno (suficiente para dar o ponto de amassar o pão). Desmanchar o fermento em meia xícara de leite morno. Misturar com 1 colher de açúcar e 1 xícara de farinha. Deixar fermentar por uns 10 minutos. Acrescentar os demais ingredientes, aos poucos, sendo que o manjericão deve ser previamente misturado na manteiga derretida e morna. Amassar e sovar muito a massa, até ficar homogênea e leve. Deixar crescer por 1 hora. Enrolar os pães e deixar crescer até dobrar de tamanho. Pincelar com gemas ( 2 gemas desmanchadas em 1 colher de água). Assar em forno não muito quente.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

MADAME "ZOHRA"

           Minha sogra, quando morou em Paracatu/MG, abriu um restaurante num grande posto de gasolina da saída da cidade. Lembro-me que o fogão era enorme, com oito bocas e ficava no centro da cozinha. Além do restaurante ela alugava alguns quartos, contíguos ao posto, para os inúmeros viajantes que por ali passavam, rumo à Brasília, Goiânia ou Unaí. Era uma vida muito dura, ganhava um bom dinheiro mas levava bastante calotes, também.

Eu, que morava em Brasília, distante uns 200 km, adorava passar os finais de semana na casa dela; uma casa antiga dos tempos coloniais. Aliás, a cidade toda é um verdadeiro museu a céu aberto com casario e igrejas dos áureos tempos da mineração. Gostávamos de ir até as margens do rio Paracatu e seus pequenos afluentes para bater peneiras ou bateias.

 Nosso intento não era pegar peixes e sim tentar “garimpar” pó de ouro, metal ali abundante nos século XVIII e XIX,  tempos de Ana Jacinta de São José, a famosa Dona Beija, sua mais ilustre moradora. Ainda guardo um pequeno frasco cheio do valioso pozinho dourado, fruto de nossas aventuras garimpeiras.

Minha sogra resolveu fechar o restaurante após ter levado calote de um cearense muito alegre e falante que “levou a velha no bico” e por ali ficou por mais de um mês, comendo, bebendo e dormindo. Fugiu sem pagar a conta, deixando umas sacolas no quarto onde dormia e quando minha sogra foi “confiscar seus bens”, só encontrou duas redes velhas e várias bermudas e camisetas sujas.

 Passou a fazer bolos doces e salgadinhos para festas, pois não queria sair da cidade e muito menos morar conosco em Brasília. A bem da verdade, eu dava graças a Deus pois sempre fui partidário daquela máxima que ensina: “a sogra não deve morar tão longe a ponto de vir com malas e nem tão perto a ponto de vir só de chinelos...”

 Para complementar sua renda, passou a ler sorte e eu fui o causador dessa transmutação da excelente cozinheira que era para uma esperta “Buena Dicha”...Ela era descendente de espanhóis, da Catalunha, e sua sala era lotada de objetos  relacionados à Espanha: touros, castanholas, dançarinas de flamenco, leques e quadros de toureiros.

Olhando tudo aquilo, certo dia, tive a brilhante idéia: “Cibelle; já que você está nesse aperto danado, porque não começa a ler sorte. É só arrumar um baralho de tarô, decorar o significado das figuras e fazer cenas de mistério”. Ela adotou a idéia na hora, lembrando-se de que sua avó, Assunción Mariño, sabia ler as cartas.

 Comprei-lhe os apetrechos, inclusive um livro que ensinava os segredos da quiromancia. Em poucos dias ela estava “afinada”na leitura das mãos e no tarô. No início, anotava nas costas das cartas a primeira letra dos presságios: Nas costas do valete de copas ela escrevia “A” de amor ou amante apaixonado. Na dama de espadilha, era a letra “R” de rival; no reis de ouro era o $, de marido rico; no reis de espada, o “V” de vingança ou marido ciumento e assim por diante.

Resultado disso tudo foi que durante anos, com o pseudônimo de Madame Zohra, ela ganhou seu dinheiro na maciota e foi uma cartomante de sucesso até o fim da vida. Criou e manteve os sonhos de muita gente e falando em sonhos, vou transcrever uma receita dela que é  uma doçura:

 SONHOS DA CIBELLE:  2 colheres (sopa) de margarina ou manteiga; 2 colheres cheias de fermento (ou 3 tabletes); 20 colheres de açúcar; 2 ovos inteiros; 1 copo de leite morno; 1 pitada de sal e farinha que dê para amassar. Enrolar os sonhos e cobrir com um pano grosso, para crescer. Ponha uma bolinha da massa em um copo com água:quando subir, pode fritar os sonhos em óleo nao muito quente. Espalhar açúcar por cima e rechear com geléia ou com CREMINHO DE MAIZENA (meia lata de leite condensado, meia lata de leite comum; meia lata de creme de leite 1 gema e 1 colher de maizena, levar ao fogo até engrossar).