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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

A "MALA DE PAU"

Quando minha mãe ia à cabeleireira para cortar o cabelo e fazer permanente era assim: os três filhos mais velhos ficavam na casa de minha tia e os três mais novos, ela os levava consigo. Normalmente era em tardes de sábado e nesses dias, a rotina lá em casa mudava um pouco. O almoço saia mais cedo, a roupa não era lavada e nosso banho era mais caprichado. Como eu era o menor, minha irmã cuidava de mim, no chuveiro. Era aquela choradeira, pois ela esfregava tanto meu pescoço e orelhas que deixava-me todo vermelho e ardendo.

Depois, para o processo de "secagem", colocava-me em pé sobre um antigo baú de madeira, com tampa abaulada que minha avó Adelaide trouxera de Portugal, no início do século passado. Vai-se saber quais louças preciosas ou tralhas necessárias vieram, diretamente de Coimbra, naquela respeitável "mala de pau". Entretanto, na minha infância e adolescência, o móvel de carvalho servia-se apenas para guardar roupas sujas ou sustentar moleques molhados.

Num sábado desses, já estávamos todos prontos para acompanhar mamãe ao "Salão da Margarida" que ficava distante de casa, quase no fim da Avenida. Não me recordo bem qual arte aprontei, mas fiz por merecer uma surra de minha mãe. Só me lembro de que, enquanto ela procurava o cordão do ferro elétrico para aplicar-me o corretivo, corri a esconder-me dentro da mala de pau.

Quando ficava nervosa, minha mãe tinha a mania de falar demais, numa lamúria sem fim e, na maioria das vezes, aquela cantilena monocórdica acabava por acalmá-la. Então, fiquei ali, bem quietinho, com as pernas encolhidas, esperando chegar a "calmaria".

Sobre a maciez das roupas usadas, acabei por adormecer profundamente, alheio ao "fuzuê" que se armou na minha casa, por conta de meu sumiço. Inicialmente minha mãe queria achar-me para a aplicar a sova prometida, depois para que eu não sujasse a roupa de passeio, mais tarde porque perdera a hora da cabeleireira e finalmente, quando anoiteceu, desesperou-se pensando que eu havia sido sequestrado.

_ Meu Deus... os ciganos estiveram aqui hoje pra buscar o porco: devem ter carregado o menino!

Naquela tempo, meu pai vendia porcos, galinhas, cabritos e toda a espécie de animais, que trazia do sítio. Esses bichos ficavam num grande cercado que existia em nosso quintal e minha mãe se encarregava da venda no varejo a diversos fregueses da redondeza. Dentre os compradores, "vira e mexe", apareciam os ciganos que acampavam na parte alta da cidade, perto da antiga caixa d'água. Meu pai tinha amizade com todos.

Assim que papai chegou da roça, minha mãe, em prantos, implorou para que ele fosse ao acampamento dos "gitanos" a minha procura. Mas, o velho retrucou, incomodado: _Alzira, como é que eu vou lá perguntar uma coisa dessa para eles?! São gente boa e isso de roubarem criança é lenda... Seria uma ofensa das bravas!

Mamãe já estava disposta a "quebrar violinos e pandeiros", quando minha irmã chamou lá do banheiro: _ Mãe, achei o safadinho!

A velha levantou-me em seu colo, ainda dormindo. Sentou-se na tampa do baú e começou a beijar-me, chorando baixinho. Acordei-me sentindo aquele cheirinho gostoso de mãe. Vendo-a chorando, segurei uma das pontas de seus cabelos finos e macios e somente consegui perguntar: _ A senhora não fez permanente?

Ela respondeu-me, dando um daqueles seus beijos estalados: _ Não, filhinho! A Margarida não abriu o salão hoje...

Assim era minha mãe e, quanto à mala de pau, não sei que fim levou!

Por falar em ciganos, segue aí uma receita, modificada ao meu gosto, de:

ARROZ À MODA CIGANA: 2 xícaras de arroz temperado e cozido; 1/2 xícara de pinhões pré-cozidos ou castanhas do Pará; 3 colheres de manteiga; 1 xícara de queijo suiço (aqueles com buracos) picado; 3 ovos batidos; 2 copos de leite; 1 xícara de espinafre cozido, com sal e picado; 1 xícara de brócolis cozido, com sal e picado, 1 cebola picadinha.

Corte os pinhões ou as castanhas em filetes bem finos. Dê uma leve fritada na manteiga e misture aos demais ingredientes. Leve ao forno por 15 a 20 minutos.



6 comentários:

  1. Olá João..
    Já me inscrevi como sua seguidora.
    Esta sua história da mala de pau, abriu meu baú de recordações.
    Era costume dos imigrantes trazerem seus pertences em grandes malas de madeira, que vinham nos navios. Quando menina, lembro-me que no porão de nossa casa havia dessas malas. Nunca me atrevi a entrar dentro de uma, tal era meu medo de abrir e sair de lá uma alma de outro mundo.
    Deus me livre.
    abços

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  2. Pois é, Cristina; naquele tempo a madeira era farta. Hoje nem se pode cogitar nisso ante o desmatamento inconsequente de nosso planeta.
    Seja bem vinda!
    Abraços
    João

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  3. Caro confrade e amigo João!
    Que momentos deleitantes sua supimpa crônica me proporcionou, porque parece que o via na mala de pau!!!!...Minha adorada e saudosa mãe quando ficava exasperada fazia como a sua mãe, porque falava tanto em tom de lamúria que me deixava atordoado!!!!... Quem fazia a permamente na minha mãe eram as minhas irmãs mais velhas!!!... Você realmente abriu a tampa da mala de pau, porque fez com que minhas reminiscências também viessem a todo o vapor!!!...
    Até breve...
    João Paulo de Oliveira
    Diadema-SP

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  4. Pois é, meu amigo! Quis fazer graça com essa estória e acabei chorando...
    Abraços
    jOÃO

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  5. Caro João....

    rsrsrsrsrs...
    Encontrei por acaso seu blog, quando estava a procura de alguma coisa sobre as Maravilhosas historias Bendix....
    Amei tudo que li e já estou seguidora de suas historinhas de outros momentos felizes que vi- vemos.
    Abraços
    Cris agora de Floripa....


    Abraços.izes que v

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  6. Obrigado, Cris de Floripa. Volte sempre!
    Agora eu tenho duas "Cris es" seguindo-me... rsrsr
    João

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