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"Crenças e Desavenças" - Editora Baraúna
"Qual será o Sabor da crônica?" - Editora Baraúna
Cada título contém 40 crônicas e pequenos contos de pura alegria com o mesmo número de receitas "que dão certo". Pedidos através:
www.editorabarauna.com.br - www.livrariacultura.com.br - jbgregor@uol.com.br

sexta-feira, 23 de abril de 2010

A NOEMY

Certa vez, passei temporada em um Hotel de Águas de São Pedro/SP, e a proprietária tornou-se minha amiga. Noemy já era coroa e vestia-se de uma forma bem característica, com longas saias de tecido indiano, muitos colares, pulseiras e sandálias de couro cru. Seus compridos cabelos já estavam começando a branquear e eram amarrados numa espécie de coque, propositalmente mal preso.

Apesar do aparente desleixo, ela era bem perfumada e de maneiras finíssimas. Tinha uma voz doce e melodiosa que encantava a todos. Gostava de organizar, pessoalmente, os entretenimentos para os hóspedes. Cantava, tocava banjo, promovia bailes, jogos e gincanas, principalmente para os grupos com mais idade.

Batíamos longos papos e um dia perguntei-lhe qual o era o segredo para manter tanta vitalidade e entusiamo. Afinal de contas, pensava eu, era viúva e enfrentara uma barra pesada, com duas filhas para criar, além da responsabilidade de manter um hotel.

Era lá pelas quatro horas da tarde, intervalo em que os hóspedes costumavam tirar uma soneca, para alisar as rugas e ela, então, resolveu contar-me sua história. Sentou-se num sofá do Hall, ajeitou os fios de cabelos que teimavam em escapar do coque e confidenciou-me: _ João, eu não sou viúva... Aliás, não sou viúva, nem casada e nem solteira. Há cerca de vinte anos, meu marido saiu para comprar um quilo de linguiças e não retornou até hoje!

Ver imagem em tamanho grande Enquanto ela retirava os enormes brincos indianos das orelhas, pude observar os rasgos ocasionados pelo uso contínuo daqueles pesados balangandãs. Assim, distraído, perguntei-lhe: _ Mas, ele largou de você, foi isso?

Massageando, delicadamente, os lóbulos vermelhos, ela continuou:

_ Não sei te dizer! Era naqueles tempos da ditadura, de prisões e perseguições e um tio meu, que era militar, procurou por ele até nas dependências do DOI-CODI e... nada de encontrar o homem!. Às vezes penso que juntou-se à alguma seita religiosa ou esotérica e deve estar em algum lugar dos Andes, mastigando coca com as lhamas...

Querendo esticar conversa, eu voltei a perguntar: _ Mas, por que você pensa assim, ele era espiritualista, hippie?

_ Mais do que isso, era completamente doido. Quando a gente começou a namorar, eu era bem novinha e fiquei encantada com as loucuras que ele aprontava. Filho único, seu pai era dono deste hotel, com muito dinheiro. O velho tinha o maior desgosto, já que o filho não assumia responsabilidade alguma. Só queria saber de farras e festas, onde a bebida e maconha rolavam soltas.

Apesar disso tudo, Noemy, definiu-me seu primeiro amor com boas expressões da época: _ Era um pão, um verdadeiro pedaço de mau caminho!

_ Como nossos parentes não queriam nosso casamento, optamos por fugir. Ele pegou um tanto de dinheiro e a mercedes novinha do pai e lá fomos nós, estrada afora, rumo à São Tomé das Letras. Pelo meio da noite, paramos para descansar e ali, ele esvaziou uma garrafa de gin e fumou vários cigarros de maconha. Quando amanheceu, lá estava eu, desesperada e ele em estado letárgico... até que a polícia mineira chegou e levou-nos para a delegacia.

Acabaram por se casar, mas os pais não compareceram à Igreja. O sogro dela consentiu em deixá-los morar no hotel, em um pequeno apartamento, todo arrebentado, ao lado da cozinha. No mesmo dia do casamento, enquanto realizava-se a cerimônia religiosa, o velho resolveu trocar algumas telhas do apartamento. Quando os noivos e alguns amigos retornaram ao hotel, encontraram aquela balbúrdia...

_ Meu sogro escorregou do telhado, caiu e quebrou o pescoço. Morreu na hora e nossa lua de mel foi no velório. Assumimos o controle do Hotel, tivemos nossas filhas, vivemos relativamente felizes por oito anos, até que aconteceu o episódio da linguiça.

Muitos anos depois, conheci o Ariel, numa reunião esotérica, e estamos juntos até hoje. Sou vinte anos mais velha do que ele, mas nos amamos demais!

Mais tarde, ela apresentou-me ao Ariel, um rapaz bem alto, com cabelos lisos e compridos. Usava umas roupas esquisitas, com tiras de couro cru, penduradas no peito. Toda romântica ela perguntou-me: _ Ele não é lindo? Parece até Jesus cristo...

Olhando para aquele tipo diferente, eu pensei: "Tá mais pra índio comanche..." Em tom de brincadeira, cochichei para ela: _Esse daí nunca foi ao açougue?

Com uma gostosa gargalhada ela respondeu, orgulhosa: _ Que nada! Ele é vegetariano, só come da minha horta...

Falando em horta, vou ensinar como se faz um cabrito assado:

PERNA DE CABRITO ASSADA: 1 pernil de cabrito novo, com ossos; 1 cebola grande; 2 ramos de alecrim; 3 folhas de louro; salsa e cebolinha desidratadas; 8 dentes de alho; 1copo de azeite de oliva, 1 copo de água; meia garrafa de vinho branco seco; 1 limão grande; 1 vidro de molho inglês; bacon cortado em cubinhos; 3 colheres de manteiga; sal e pimenta do reino.

MODO DE FAZER: Com uma faca larga, faça talhos profunfos em todo o pernil. Esfregue por toda a carne, o sal e a pimenta. Bata no liquidificador, o suco do limão, a cebola, os dentes de alho, o louro, a água, o molho inglês, a salsa e a cebolinha. Joque ese tempero batido sobre o pernil. Enfie em cada buraco feito com a faca, um cubo do bacom. Por último, besunte com o azeite e o vinho. Leve ao fogo a manteiga e os raminhos de alecrim e dê uma rápida fritada. Despeje no cabrito e enrole a carne em papel alumínio. Assar por umas duas horas e meia. A cada meia hora, descubra o assado regue-o com o molho que se forma na assadeira.

Sirva com batatas e brócolis, cozidos e ligeiramente dourados em manteiga.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

A MARIA DO CARMO

Quando trabalhei em Brasilia, ainda na época da ditadura militar, tinha uma colega cearense chamada Maria do Carmo que namorava um dos chefões do Serviço de Censura, Coronel "Não Sei das Quantas".

A Do Carmo já era bem coroa e feia como o capeta, além de mancar da perna direita. O que tinha de feia, tinha de brava e ... coitado daquele que se tornava seu inimigo!

Certo dia ela convidou-me para um jantar em sua casa (em Brasília tinha muito disso), cujo prato seria o famoso "Baião de Dois", comida típica do Nordeste, feito por Severina, sua cozinheira. O tal do coronel da censura iria também (diga-se de passagem que a Do Carmo ganhava, em primeira mão um exemplar de todos os discos que seriam ou não lançados, após o crivo da Censura).

Cheguei mais cedo para ouvir alguns dos "discos proibidos" e pude acompanhar a cozinheira na confecção do prato, anotando tudo, passo a passo.

A Do Carmo não tinha filhos e sua grande paixão era uma cadelinha (tão velhinha quanto a dona) chamada Champagne que soltava pelos e puns, pela casa toda. Estávamos sentados num sofá daqueles bem fundos e gordos, quando o "Coronel Censura" chegou. Ao levantar-me para cumprimentar o homem, pisei, com toda a força, sobre o quadril esquerdo da cadela e foi aquele escândalo: cadela latindo, Do Carmo gritando, coronel tossindo e eu gemendo pela mordida que levei.

Ligamos para a médica de Champagne e fomos (eu e a Do Carmo) até a Clínica, aberta somente para atender a bichinha.

Resultado: saímos de lá depois da duas da matina com a cadela enfaixada da cintura para baixo (cachorro tem cintura?!) e a Do Carmo chorando e brava comigo pois, devido à idade avançada (da Champagne), a médica veterinária achava que os ossos não mais se soldariam.

Paguei a consulta caríssima e fiquei sem comer o "Baião de Dois" da Severina . O osso soldou-se mas desde então, a cadelinha também ficou coxa do lado esquerdo e _ diziam as pessoas maldosas _ que nas caminhadas que as duas faziam pela quadra, enquanto a Do Carmo mancava do lado direito, Champagne puxava do esquerdo. Na cadência dos passos, minha ex-amiga dizia à mascote: "Deixa que eu chuto essa, Champagne!"

A colega nunca mais conversou comigo, até o dia de sua morte. Adefuntou-se por síncope cardíaca, após tomar um copo d'água gelada. Diz a lenda que quando o copo caiu ao chão, a cadela deu um longo uivo.

Depois disso, já fiz o tal prato várias vezes. É excelente, apesar de fazer-me lembrar daquela noite desastrosa. Vale a pena vocês experimentarem, portanto, anotem aí o famoso:

Baião de Dois da "do Carmo" 1 Kg de feijão-de-corda (na falta deste, experimente o feijão fradinho ou guandu); 1 kg de arroz; 1 kg de carne seca; 1 kg de carne de vaca (coxão mole ou músculo); 800 gramas de linguiça toscana ou calabresa; pimenta a gosto; cebola e cheiro verde picadinhos e 1 pimentão vermelho cortado em retalhos.

Cozinhe o feijão por 30 minutos, mais ou menos. Em outra panela, cozinhe a carne seca já dessalgada (para dessalgar,deixe-a de molho na água de um dia para o outro) juntamente com a carne de vaca, ambas cortadas em cubos pequenos, por 40 minutos. Afervente a linguiça, tire a casca e corte-a em cubos pequenos. Escorra bem todos os ingredientes. Numa panela grande, frite a cebola, o pimentão e o cheiro verde, juntando as carnes picadas, fritando mais um pouco. Em seguida, coloque o arroz lavado e escorrido. Junte o feijão já semi cozido (com tempero normal) com todo o caldo. Acrescente mais água fervente suficiente para cozinhar tudo. Prove o sal e deixe cozinhar em fogo baixo, de modo que fique um pouco úmido. Se necessário, coloque por debaixo da panela um "Chapex" para o Baião não grudar no fundo. É delicioso!

sexta-feira, 9 de abril de 2010

O PADRE PACO

Conheci o padre Paco pouco antes dele "largar a batina". Aliás, nem usava batinas...

Era natural da catalunha, numa região denominada Costa Brava, ao nordeste da espanha. Passou toda a infância miserável, com seus pais e mais nove irmãos, a limpar mariscos e todas as espécies de moluscos e peixes do mar. Posteriormente eram levados em grandes cestos e vendidos nos mercados ou feiras das cidades próximas. Ele dizia que o mau cheiro era tamanho que por toda sua vida carregou "aquele odor obsceno" nas narinas.

Já na adolescência, pegou amizade com o pároco da aldeia onde moravam o qual, interessado na vivacidade do rapagote, ajeitou-lhe uma vaga em um seminário de Barcelona. Foi a forma que encontrou para estudar, alimentar-se e fugir daquela vidalazarenta que levava.

Nunca mais retornou à aldeia natal pois, ordenado clérigo, partiu para Mallorca, posteriormente para as Ilhas Canárias e bem mais tarde, para o Brasil. Aqui, ele foi designado para várias paróquias, não parando muito tempo em cada uma, até que veio para a região e tomou-se de amizade com meu irmão mais velho.

Eu achava estranho aquilo, pois meu irmão é completamente ateu e como iniciou-se essa amizade eu não sei. Mas, em todas as festas e almoços, com a nossa parentela, o padre estava junto e ele era bem divertido. Sabia cozinhar também e adorava uma vodka bem gelada que, segundo ele, não deixava bafo.

Sua mania de contar piadas, sempre irreverentes, sua maneira de olhar bundas e peitos das mulheres, não me deixava iludido e até comentei com meu irmão: "Esse espanhol, de padre não tem nada e se vestisse batina de bronze, a gente escutaria muitas badaladas!"

Não demorou muito e ele deixou o sacerdócio para unir-se a uma de suas fiéis paroquianas, que cuidava dos eventos e reuniões da turma da "Renovação Carismática". Nunca mais vi o ex-clérigo. Há pouco tempo meu irmão contou-me que ele faleceu e a viúva nem vestiu luto... Foi vitimado por um incárdio no miofarto (síncope cardíaca decorrente de esforços repetitivos após a ceia), ao lado de uma desconhecida, em pleno Motel.

Bem, pelo menos, deixou alguma coisa de bom pois que me ensinou a fazer a paella de Costa Brava, e instruiu-me de que sua paella era diferente da Valenciana (que não leva carne de nada, apenas legumes e arroz); que paella é frigideira, em espanhol e que paellera são as mulheres que cozinham essa iguaria. Já fiz por diversas vezes e é um dos pratos mais solicitados pelos parentes e amigos:

PAELLA DA COSTA BRAVA (alterada ao meu gosto): 700 gramas de linguiça de porco; 700 gr de filés de frango (em pequenas tiras); 700 gr de filés de peixe (dourada, cação ou merluza); 1kg de camarões grandes (sem a casca); 500 gr de mexilhões limpos; 500 gr de polvo; 500 gr de lulas (em rodelas); 500 gr de mariscos (já limpos e aferventados); 500 gr de arroz; 1 pimentão verde e outro amarelo (ou vermeho) cortados em tiras ou em triângulos; 1 kg de tomates maduros sem a pele (em pedaços de 2 cm); 2 cebolas picadinhas; 6 dentes de alho em fatias; 2 latas de ervilha (ou 500 gr de ervilhas frescas); 1 colher(rasa) de tomilho seco ou sálvia; 2 tabletes de caldo de galinha; 1 xícara de vinho branco seco (para aferventar os mariscos); azeite de oliva; pimenta; sal; cheiro verde e 1 colher das de sopa de açafrão (imprescindível!; e melhor será se encontrar o legítimo açafrão espanhol, em estames); 300 gr de feijão verde já pré cozido, mas firmes (aquele lá do Nordeste, opcional, se você encontrar para comprar).

Modo de fazer: temperar o frango e o peixe separadamente (com alho, cebola, sal e molho inglês). Aferventar, separadamente, com água e pouco sal, o polvo, a lula e o mexilhão. O marisco (que é opcional), deverá ser aferventado, em panela tampada, com o vinho até que as conchinhas se abram (as que não se abrirem, jogue-as fora).

Numa frigideira apropriada (paella), frite, no azeite, a linguiça em pedaços pequenos (1,5 cm) e reserve-as. Acrescente mais azeite (se necessário) e frite os pedaços de frango, reserve. Em seguida, frite o peixe e reserve. Junte mais azeite (se necessário) e frite as fatias de alho e a cebola picadinha. Junte a lula, o polvo e os mexilhões, refogando um pouquinho. Acrescente o tomate, os pimentões coloridos, as carnes reservadas e 1 xícara de água morna contendo o caldo de galinha e o açafrão dissolvidos (se o açafrão for em estames, devem ser esmagados na água morna) e deixe refogar por uns 10 minutos. Junte o arroz, o feijão verde (opcional), o camarão, a ervilha e os temperos. Misture tudo e acrescente água fervente suficiente para cozinhar tudo (4 ou 5 xícaras). Experimente o sal e mexa, misturando tudo muito bem (só uma vez). Tampe a frigideira e deixe cozinhar em fogo brando por cerca de 20 minutos (tem que ficar meio úmido). Espalhe por cima o cheiro verde e enfeite com os mariscos abertos, camarões gigantes ou lagostins pré cozidos em água e sal. Apague o fogo e deixe a frigideira abafada (com a tampa e um pano úmido por cima) por uns 10 minutos, antes de servir.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

A PROFESSORA

O terceiro ano primário eu fiz duas vezes; repeti o ano devido à perseguição da professora Dna. Zoraide, turca, baixinha, mal amada, neurótica eesquizofrênica a qual, para o bem da Nação, já morreu... Naquele tempo, as mães entregavam os filhos na escola com a recomendação: "Se ele não obedecer, pode bater!"

E elas batiam... com as mãos ou com a enorme régua de madeira que era uma verdadeira arma branca. Tenho um pequeno buraco na cabeça resultante de uma reguada de ponta que levei só porque me recusei a cantar uma musiquinha em homenagem à Princesa Isabel nas comemorações da aboliçãoe que eu gravei para sempre:

"Princesa Dona Izabel, mamãe disse que a senhora, perdeu o seu lindo trono mas tem um mais lindo agora. No céu está esse trono, que agora a senhora tem, além de ser mais bonito, ninguém o tira, ninguém!".

Um dia, minha mãe deu-me um pote de geleia de mexerica para presentear a professora (era costume esses mimos). Com muita má vontade ela aceitou o doce, colocando o pote em cima da mesa. Naquela mesma manhã, durante o recreio, tomei uma coca-cola das grandes (recém lançada) e fui para a classe. Logo em seguida, apertou-me a vontade de fazer xixí e pedi para a jabiraca deixar-me ir um pouquinho lá fora, pedido secamente recusado: _Gregório, você acaba de vir do intervalo, fique quieto se não vai para a diretoria! _ tentei segurar mas a vontade era demais. Pedi de novo e a resposta foi um "Cala a boca".

De tanto eu teimar, ela acabou colocando-me de castigo dentro da lixeira, um cesto enorme de arame trançado que ficava no fundo da classe. A vergonha e a vontade de fazer xixi era tanta, que de raiva, virei-me de costas e descarreguei a água!

Um dos colegas gritou: "Fessôra, o Gregório tá mijando!!". Pedi a proteção divina e continuei, até que senti grudar em meus cabelos as garras daquela harpia com cara de mulher e corpo de coruja. Conforme ela girou-me para frente, continuei a urinar... em suas saias e sapatos. Foi aquela gritaria histérica e ela não sabia se me batia, se chacoalhava as saias ou se batia os pés. Levou-me pelas orelhas até a diretoria onde recebi uma suspensão por três dias.

Voltei para a sala de aula para pegar meus cadernos e quando vi o doce que lhe dera, não resistí: peguei o pote e o atirei na megera que desviou a cabeça, no momento exato em que espatifou-se na lousa, espalhando a geleia por todo o lado. Fui expulso da escola e só pude completar a terceira série em outra escola onde fui adimitido com restrições. A bruxa jamais experimentou a mexerica de minha mãezinha mas para vocês eu vou passar a receita que é uma verdadeira ambrosia dos deuses:

GELEIA DE MEXERICA: Descascar as mexericas, daquelas mais azedinhas, difícil de descascar (tangerina ou "fididinha")) e retirar toda a pele branca. Cortar, tirar as sementes e bater, levemente, no liquidificador. Medir o mesmo tanto de massa e açúcar. Levar ao fogo até o ponto cremoso. Juntar a casca de uma delas (cortada em tirinhas bem fininhas e aferventadas antes). Deixar ferver por mais 5 minutos. Delícia!!!!!

quinta-feira, 1 de abril de 2010

O ADOLPHO POLACO


Lá em casa, a Páscoa era a data mais festejada do ano. Além da ressurreição de Cristo, também comemorávamos o aniversário de meu pai. Ele nascera em 1916, num longínquo domingo de Páscoa e por isso, recebeu o nome de Paschoal. Não importava em qual dia do mês de março, desde que fosse no domingo da Páscoa, os amigos e familiares apareciam para o almoço festivo, aquela coisa de italianos, com mesa farta, muito vinho e assados de todo tipo.

Meu pai tinha um amigo, grandão e branco como um porco landrace. Não sei qual a nacionalidade dele mas era conhecido por Adolpho polaco e morava em um sítio onde não havia luz elétrica e nem banheiros, cuidando de seus rebanhos de cabras e carneiros.

Certa vez, aconteceu um acidente tragicômico com o homem que culminou com sua ida ao hospital e virou piada na cidade: Devido à sujeira e falta de higiene em que vivia, ele ficou infestado de piolhos e no intuito de matar os parasitas, esfregou querozene em todos os pelos do corpo, tanto nas partes púdicas como nas impúdicas.

Durante a noite, com uma lamparina acesa, tentou verificar se os piolhos haviam morrido mas ao aproximar demais o pavio de suas virilhas o fogo passou para seu corpo, chamuscando tudo quanto tinha de pelos e penugens. Ficou vários dias de quarentena com as pernas abertas, penduradas e cobertas apenas com um fino lençol.

Meses depois, na Páscoa, meu pai convidou o amigo para almoçar lá em casa. Quando chegamos da missa, desde a rua já sentimos o aroma delicioso da leitoa à pururuca que só minha mãe sabia fazer. A mesa estava posta e o Adolpho polaco, já meio zonzo pelos canecos de vinho que meu pai servia, falava alto e gesticulava a todo vapor.

Nossa casa era assobradada e no canto da cozinha tinha um pequeno cano de metal por onde escoava a água em dias de faxina. Fomos, eu e meus irmão, pelo quintal e utilizando-nos do cano como um gramofone, gritamos a plenos pulmões: "Adolpho polaco, botou fogo no saco... Adolpho polaco, botou fogo no saco..."

O homem virou uma fera e não sabendo de onde provinha a zombaria, saiu pela rua, esbravejando e procurando os autores da desfeita.

Minha mãe, esperta, descobriu logo e sem que a visita desconfiasse, trancou-nos, de castigo, na despensa dos fundos. Resultado: enquanto o chamuscado refestelou-se com a leitoa, nós ficamos em jejum até à noite quando nos foi permitido provar de uma sopinha de fubá bem chinfrim.

Desde então, lembro-me dessas passagens de minha infância toda as vezes em que faço um carneiro ou uma leitoa assada.

CARNEIRO À CAÇADORA :
Para o cozido - 3 Kg de carneiro, cabrito ou coelho novos (8 meses, mais ou menos) em postas; 2 latas de ervilhas (prefiro pacotes de ervilhas semi congeladas); 1 kg de batatas (cortadas em 4), 1/2 kg de cenouras em rodelas; 1 kg de tomates (sem sementes) cortados em 4; 12 mini cebolas inteiras; 2 pimentões em cubos e azeitonas pretas. Se quizer, pode acrescentar favas cozidas e escorridas.

Para o tempero - Tempere os pedaços de carne com sal, azeite e algumas folhinhas de alecrim. Deixe a carne de molho (de um dia para o outro) na seguinte marinada, batida no liquidificador : 3 cebolas grandes; 1 cabeça de alho; 1 galhinho de manjericão; folhas de hortelã, de sálvia; 3 folhas de louro; 1 molho de salsa e cebolinha; 1 copo de vinho branco seco; 1 copo de água; 1 copo de vinagre branco; 1/2 vidro de molho inglês ou shoyo e pimenta a gosto. No outro dia, frite as postas de carne numa panela grande, até ficarem bem douradinhas. Escorra o excesso de gordura (importante!) e cozinhe, acrescentando água fervente, aos poucos e até ficarem bem macias. Junte os tomates, as mini cebolas, os pimentões e as azeitonas. À parte, cozinhe em água sal as batatas e as cenouras. Junte esses legumes, mais as ervilhas, à panela e misture tudo, de leve para não desmanchar os legumes. Sirva com arroz branco.

LEITOA À PURURUCA: a leitoa não deve ser grande e nem muito gorda (uns 7 a 8 quilos) e temperada de véspera, da seguinte maneira: perfure a carne em vários pontos (sem cortar a pele), esfregue sal, pimenta-do-reino e alho espremido por toda a leitoa, principalmente nas partes do couro. No liquidificador, bata uma vinha d'alhos com duas cebolas grandes uma cabeça inteira de alho, uns raminhos de alecrim, 3 folhas de louro (ou louro em pó), 5 colheres de molho inglês, 1 copo de água, 1 copo de vinho seco (branco ou tinto), azeite de oliva e pimenta a gosto. Em uma vasilha larga e rasa (não pode ser de alumínio) coloque a leitoa com o couro para cima (a pele não pode ficar molhada) e deixe tomar tempero. No dia seguinte, leve-a para assar em forno alto e pré-aquecido. Não é necessário cobrí-la, desligue o forno somente quando a pele ficar com uma cor de caramelo escuro e crocante. Sirva com limão, farofa (receita do dia 13 de junho), arroz branco, tutu de feijão e couve refogada. O segredo é não deixar a pele da leitoa em contado com a vinha d'alhos.