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"Crenças e Desavenças" - Editora Baraúna
"Qual será o Sabor da crônica?" - Editora Baraúna
Cada título contém 40 crônicas e pequenos contos de pura alegria com o mesmo número de receitas "que dão certo". Pedidos através:
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sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

A SORAYA - I

Ver imagem em tamanho grande Mandei-lhe um e-mail, desejando um Feliz Ano Novo para ela e toda a família. Olhem a resposta que recebi: "Ano Novo, vida velha... Detesto família, só a Sagrada mesmo e pendurada na parede! Chega! de saco cheio...."

Mas, tanta revolta tem motivos, pobrezinha...Que vida mais apertada a dela!

Eram em cinco irmãs, filhas de judeus que se fingiam de católicos para serem aceitos na pequena cidade onde viviam. O pai era tão sovina que a mãe, Dona Esther, tinha que dar aulas de piano a fim de juntar algum dinheirinho, totalmente gasto na compra de "pequenas bobagens" para as meninas.

O velho era tão ignorante que deixou suas filhas com muitos traumas de infância. Um deles, vitimou minha amiga... síndrome de calcinhas no varal:

Numa tarde ensolarada, o pai chegou particularmente infernado e ao ver o varal de roupas lotado de calcinhas de sua mulher e filhas, desandou a rasgar todas e a gritar descontroladamente: _Isso aqui parecendo casa de putas! Olha a vizinhança toda vendo essas vergonhas!

A Soraya conta que sua mãe teve que dar muitas aulas de piano para poder renovar aslingeries das filhas e a partir daí, as peças eram penduradas atrás do motor da geladeira, até secarem.

Mesmo depois de casada, ela ainda relutava em utilizar varais externos e quando o fazia, cobria as calcinhas com alguma cueca do marido. O homem não se conformava com aquilo e dizia: _Pára com isso, Sôra... Até a rainha da Inglaterra usa calcinhas!

E esse marido dela, então...que criatura mais estranha! Era santista roxo e tinha o apelido de baleia, em alusão ao mascote do Santos Futebol Clube. Vestia-se de uma forma completamente ridícula e até nas churrascarias e restaurantes ele ia com chuteiras e a indefectível camiseta do clube santista... maior mico !

Enchia a banheira de água e ficava horas, brincando com as baleinhas de plástico e bonequinhos da Disney, em todos os tamanhos. A cama do casal era dividida em duas: na metade dela, tudo normal e na parte dele, lençol, fronha e coberta com distintivos e cores do time. Ai de quem usasse as toalhas de banho dele...

Durante anos ela suportou isso, sempre pensando no bem estar da única filha que tiveram.

Uma noite, porém , quando ela se viu com dois carrinhos desmontáveis nos seios, um coelhinho no púbis, um mini jato no umbigo e dois helicópteros nas mãos do marido, prontos para aterrissarem em sua barriga, ela deu o famoso berro da liberdade: "Chegaaaaaaaaa....Vá pros quintos dos infernos!"

Arrancou o coelhinho do gramado e o atirou, com toda a força dos vinte anos de raiva contida, contra o vidro protetor do quadro, afixado bem à frente de sua cama. Era uma foto do Pelé, bem novinho... quando, ainda, ostentava o uniforme do Santos Futebol Clube.

Quanto à receita... eu também tenho dó mas, depois de pronto, fica uma delícia irresistível!

COELHO COM LEGUMES:

Cortar o coelho pelas juntas e em pedaços regulares. Esfregar sal e azeite de oliva na carne; acrescentar 1 colher (chá) de alecrim. Bater no liquidificador os seguintes ingredientes: 3 cebolas; 6 dentes de alho; 1 molho de cheiro verde; algumas folhas de manjericão; 2 folhas de louro; meia noz moscada ralada; meia garrafa de vinho branco seco; 1 copo cheio de vinagre branco; meio copo de água e molho de pimenta a gosto (cumari). Despejar esse tempero batido na carne e deixar marinar, no mínimo, por oito horas.

Fritar os pedaços em óleo bem quente, até dourarem. Pingar água quente e um tanto do tempero, aos poucos, até a carne ficar macia. Em outra panela, refogar em 3 ou 4 colheres de manteiga, batatas e cenouras (pré cozidas em água e sal). Acrescente brócolis ou palmito e por último, ervilhas frescas aferventadas e 2 tomates picados grosseiramente.

Servir o coelho à parte ou misturado aos legumes, com salsinha e arroz branc

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

A CÍCERA II

Gente, como esse povo do sertão gosta de "bater uma prosa"! Conversas sem compromisso, entremeadas de risadas e besteiras. Nada melhor para desopilar o fígado de qualquer cristão estressado. Infelizmente as pessoas da cidade não sabem mais o que é isso, pois a televisão e a Internet acabaram com tudo o que era saudável em matéria de relacionamentos.

Um bom papo à luz de uma lamparina à querosene, ou candeeiro à base de carbureto, são coisas de lembranças apenas. _ Não sabem o que vem a ser isso? Azar de vocês...

Naquela noite, em que a mulher dormiu fora, Seu Jerônimo ficou contando causos até altas horas, enquanto comíamos porções de carne seca com paçoca e manteiga da terra.

Quando a Cícera voltou, no domingo, toda feliz , pois que recebera o "negócio" inteiro do cavalo, ainda fez um almoço para nós. Meio tardio, pois até matar o frango e cozinhar o feijão já era umas quatro da tarde. Mas, valeu a pena: frango refogado com cambuquira de jerimum, farofa, arroz e feijão, depois de duas ou três doses de pinga... divino!

Pelo menos foi esse o adjetivo que meu amigo Ovídio usou para elogiar os dotes culinários da Tia Ciça. De minha parte, comi só a farofa com arroz e feijão, não tocando no frango. Lembrei-mo do primeiro dia, quando chegamos: Estava faminto e praticamente devorei o frango com pirão que a boa mulher já havia preparado, a nossa espera. Comi tanto que me deu dor de barriga e meio envergonhado, perguntei ao Sr. Jerônimo onde ficava o banheiro.

Foi a mulher quem me respondeu: _Fica logo alí fora, Dr. João... _ ela me julgava importante. _Mostra o cajueiro pra ele, Jerônio! Péga o papér que tá na dispensa...

À caminho do cajueiro, levando algumas folhas de papel de embrulhar pão, eu ouvia, espantado, as instruções de Seu Jerônimo: _O doutor fica de cóqui (cócoras), no gáio mais grosso e gruda as mãos no gáio de cima. Enquanto eu seguia para a privada ecológica, percebi que várias galinhas vinham atrás de mim.

Rapaz! Foi um Deus nos acuda... Quando me ajeitei nos galhos, resolvi olhar para baixo: a galinhada estava de bicos escancarados, "esperando a morte chegar" e pulando... na tentativa de me acertar. Corri a esconder minhas vergonhas com as mãos e pensei: _ Se um frango desses me leva as bolas no bico, amanhã vai ter futebol na caatinga!!!

Voltei para a casa, com as folhas de papel intactas e somente tornei ao cajueiro quando já era noite alta. Daí pude observar, sossegado, como é belo o luar do sertão...

E agora...que receita colocar?!

Ia passar uma receita de compota de caju que aprendi em Cuiabá mas, é difícil de explicar. Portanto segue esta receita que é muito boa.

ARROZ COM CASTANHAS DE CAJU:

3 xícaras (chá) de arroz; 1 xícara (chá) de castanhas de cajú moidas grosseiramente; 4 colheres (sopa) de margarina e 4 colheres de uvas passas pretas, sem caroço.

Cozinhe o arroz normalmente, com água fervente, alho e sal mas, deixe-o bem soltinho. À parte, frite, na manteiga a castanha de caju até ficar crocante (mais ou menos 7 minutos). Acrescente as passas e frite mais um pouquinho (até elas ficarem cheinhas). Misture tudo ao arroz, delicadamente e espalhe cheiro verde por cima.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

A ELZA CAMACHO


Elza Camacho foi a primeira dama mais atuante que jamais vi. Eu a conheci durante a campanha de seu marido, para prefeito da cidade X, onde trabalhei por alguns anos. Tinha um cabelo vermelho que a destacava em meio à multidão. Todo desfiado e que mais parecia uma bola de fogo.

Estava, sempre, presente nos eventos, comemorações e comícios, distribuindo "santinhos", gritando, açulando a multidão, vaiando e discutindo com todo mundo. Durante a campanha do marido, chegou até a levar sopapos e certa vez, num "arrastão", orquestrado pelos adversários, foi empurrada para dentro de um bueiro da rua. No comício seguinte, a oposição organizou um coro para gritar nos altos falantes: "Sexta-feira que passô, D. Elza apanhô!"

Por fim, seu marido foi eleito, dizem, graças à atuação fervorosa da esposa. Ela tomou o comando dos Departamentos Social e da Cultura atuando magnificamente.Os programas e eventos que ela organizava eram impecáveis.

Por ocasião da festa do padroeiro da cidade, ela foi encarregada da montagem do altar e do andor de São João Batista. A fim de economizar dinheiro, ela contratou um carroceiro para trasladar a imagem de São João, de uma capela do bairro, para a Igreja matriz, de onde sairia a procissão com os andores de todos os santos. Amarraram a imagem na carroça e lá foi o carroceiro, não sem antes ter recebido todas as recomendações de cuidados, por parte da primeira dama.

Pelo trajeto, o homem foi parando em cada boteco e bebendo tragos de "cagibrina". A certa altura, já bastante embriagado, resolveu brincar com a imagem, dando "cavalos de pau" com a carroça: Fazia os dois cavalos correrem bastante e depois puxava as rédeas, com bastante força, para que os animais empinassem. E gritava: "Segura, São João!"

Numa dessas, a imagem voou longe, espatifando-se nas pedras da rua. O condutor, ao ver o estrago, desapareceu na poeira, sem deixar recado... D. Elza ficou desesperada. A imagem tinha mais de cem anos e a procissão seria dali a três dias! No dia seguinte, viajou para São Paulo, à procura de uma imagem do mesmo tamanho, mas não encontrou e foi daí que surgiu a idéia: Comprou um manto de lã, um cajado e dois carneiros de celulose.

Chegando à cidade, requisitou a imagem de São Cristóvão (afinal este santo não era levado muito a sério) e travestiu-o de São João, com manto, carneiros e tudo o mais. Durante a procissão, todo mundo só admirava o formidável manto novo de "São João", sem desconfiar da farsa, para alívio da primeira dama.

O prefeito e sua esposa eram carnívoros inveterados e costumavam fazer muitos churrascos em sua chácara. Aprendi com eles essa receita de picanha:

PICANHA NA BRASA : Duas ou três picanhas maturadas, sal grosso e água. Lave as peças e esfregue-as totalmente em sal grosso. Deixe ao lado da churrasqueira uma vasilha rasa contendo uma fina solução de água e sal grosso. Com as brasas ainda em chamas, toste, virando constantemente todas as partes da picanha, inclusive a parte do corte. Depois que a peça estiver bem tostada, corte a primeira fatia, passe ligeiramente o lado não tostado na solução de água e sal. Volte a fatia à grelha para tostar rapidamente a outra face. Proceda da mesma maneira com a peça inteira - passar a face cortada na solução e volta à grelha. Variar a espessura e tempo de grelha, conforme a preferência dos comensais.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

A 1ª DAMA E O MENDIGO

Em outra ocasião tive a oportunidade de falar sobre Elza Camacho, a mulher do prefeito de um município vizinho, muito aloprada mas perfeitamente atuante nos eventos e festas promovidos na cidade.

Por ocasião do Natal, ela agitava a cidade inteira, arrecadando dinheiro e doações junto aos empresários e fazendeiros do município. O produto da arrecadação era, integralmente, utilizado na decoração das ruas e prédios públicos da cidade, bem como na compra de brinquedos para presentear as crianças carentes dos bairros de periferias.

Semanas antes do Natal, ela tomava a perua da prefeitura e seguia, somente com o motorista para São Paulo a fim de comprar os brinquedos diretamente nas fábricas e alguns dos materiais que seriam utilizados nas decorações. Saiam de madrugada e só voltavam bem tarde da noite com a “Komby” abarrotada.

Numa dessas ocasiões, após ter comprado todos os brinquedos, o motorista deixou-a na Rua 25 de Março para comprar veludos e poás para a roupa do Papai Noel, enquanto ele seguia até o posto de gasolina mais próximo para abastecer o veículo. Por infelicidade, numa das esquinas da Baixada do Glicério, a perua foi violentamente abalroada e arrastada por um troleybus . O pobre motorista, inconsciente, foi levado para o Hospital das Clinicas e ali ficou por horas, até recobrar os sentidos.

Terminadas as compras, já bem no final da tarde, Dona Elza seguiu em direção ao “mercadão”, local onde o motorista combinara de esperá-la. Passada as 5 horas, passada as 6, chegada as 7 e nada de a perua aparecer. Lojas fechadas, nenhum transeunte para socorrê-la; a coitada ficou apavorada, refugiando-se na marquise de um dos vetustos prédios da região sinistra.

Ali pelas 8 da noite aproximou-se dela um mendigo, com várias sacolas na mão, que foi logo lhe dizendo: “Olha, Dona, esse lugar é meu...Se a senhora quiser se acomodar, ajeita o outro canto pois neste aqui é onde eu estendo meu cobertor!”

Dona Elza, assustada e meio nauseada com o forte cheiro acre/rançoso que exalava do mendigo, encolheu-se do outro lado, junto com suas sacolas. Quase chorando, não sabia se rezava ou se amaldiçoava o motorista. O mendigo arrancou da sacola um marmitex, todo amassado e perguntou , com voz enrolada: “Quer dividir a comida? O rango é pouco mas parece que a senhora não comeu nada ainda hoje... tá com o zóio fundo!”

Realmente, ela estava morta de fome pois não comera nada , por conta do corre-corre das compras. Quando, mais tarde, o homem sacou de dois pãezinhos e algumas bananas, ela não agüentou e aceitou o sanduíche de pão com banana. A noite ia avançada e fria, quando ela começou a chorar baixinho.

Lá pelas dez horas da noite, horário previsto de chegada, os parentes de Dona Elza começaram a preocupar-se com a demora. Ao celular que ficara na Perua, ninguém atendia e daí começaram a ligar para a polícia, necrotérios e hospitais até que descobriram o paradeiro do motorista, já consciente mas completamente “zureta”, não se lembrando de nada.

Resumindo a ópera, a primeira dama somente foi resgatada por volta das 5 da matina, dormindo, sentada no cobertor do mendigo e enrolada nos veludos do Papai Noel. Foi uma noite do cão mas, reconhecida pela bondade do companheiro, levou-o consigo para sua cidade, convencendo o marido/prefeito a contratá-lo em “serviços gerais” no pátio da prefeitura.

Naquele Natal, o Papai Noel foi um mendigo resgatado das ruas de São Paulo.

E já que falei em Papqi Noel e Natal, vou passar uma receita de rabanadas de minha tia Olívia:

RABANADAS: Uma bengala de pão amanhecida de 3 dias e cortada em fatias; 1 litro de vinho tinto seco; 1/2 kg de açúcar; 2 colheres (de chá) de canela em pó. Misturar tudo e passar as fatias de pão neste melado (dos dois lados). Fritar numa panela ou frigideira tefall (dos dois lados). Colocar, em camadas, numa travessa e espalhar por cima açúcar e canela. Com o vinho que sobrou, apurar uma calda rala, esperar amornar e despejar sobre as rabanadas. Levar à geladeira.